E no meio dessa polêmica, a chamada Tábua de Joás, peça de pedra encontrada em 2001 e que até hoje intriga cientistas e autoridades de Israel. Mais de uma década depois, especialistas ainda não conseguiram responder à dúvida: o artefato é verdadeiro ou uma elaborada falsificação? No livro sagrado, o Templo de Salomão é o local construído para abrigar a Arca da Aliança, cofre que guardaria as tábuas de pedra dos Dez Mandamentos e que teria desaparecido após a destruição do espaço, incendiado pelo exército do rei babilônio Nabucodonosor em 586 a.C.
A Bíblia faz referências à reconstrução do templo por Joás de Judá, que reinou em Jerusalém um século depois de Salomão. "Joás disse aos sacerdotes: Todo o dinheiro consagrado que se costuma trazer à Casa do Senhor (...) recebam-no os sacerdotes, cada um da mão de seus familiares, e consertem os postigos do Templo onde quer que se achem fendas", diz o capítulo 12 de Reis 2.
Texto em Hebraico versão Bíblia Hebraica Stuttgartensia*
ד רַק הַבָּמוֹת, לֹא-סָרוּ: עוֹד הָעָם מְזַבְּחִים וּמְקַטְּרִים, בַּבָּמוֹת.
Texto Transliterado Versão Bíblia Hebraica Stuttgartensia**
Obs: *(A escrita hebraico é lida da direita para esquerda) **(texto Transliterado Leitura da Esq para Dir)
A tábua encontrada também descreve em hebreu as obras feitas pelo rei: "Reparei a construção e fiz os reparos no templo e nos muros que o rodeiam".
Autêntica ou falsa?
Após a descoberta, a Tábua de Joás foi encaminhada ao Serviço Geológico de Israel para que pudesse ser - ou não - autenticada. Primeiro, examinaram a pátina, uma fina camada que se forma ao longo do tempo na superfície de uma rocha ou pedra pela interação de seus minerais com as substâncias químicas do ar, da água ou da terra. Os geólogos logo notaram que a pátina era contínua na frente da pedra e nas letras da inscrição, o que significa que foram gravadas num passado distante. Em seguida, com a técnica de datação de carbono, conseguiram precisar que a tábua tinha cerca de 2.3 mil anos.A pátina é uma fina camada que se forma ao longo do tempo na superfície da pedra[/caption] Depois, os especialistas notaram que a composição química da pedra era a mesma das que estão presentes na região de Jerusalém. E, finalmente, detectaram grânulos de ouro em sua superfície, precisamente o que se esperaria se a pedra estivesse no interior de um templo banhado de ouro, como descreve a Bíblia, durante um incêndio. Em 2003, o Serviço Geológico declarou oficialmente que a tábua era genuína. O artefato foi então oferecido à venda ao Museu de Israel, que abriga boa parte dos tesouros do país. Mas essa história não acabou aí. O museu decidiu conduzir sua própria verificação da autenticidade da tábua. Nesse meio tempo, porém, tanto o objeto quanto o homem que o havia descoberto - cuja identidade ainda era misteriosa - simplemente desapareceram. A Autoridade de Antiguidades de Israel passou a investigar o caso e, nove meses depois, chegou ao colecionador Oded Golan, que é engenheiro. Golan, por sua vez, insistiu que era apenas o intermediário de outro colecionador. Mas as autoridades suspeitaram: ele também era vinculado a outro artefato extraordinário descoberto dois anos antes, o Ossário de Tiago.
No meio do ossário, inscrição diz: "Ya'akov Bar Yoshef Akhui di Yehshúah", que quer dizer "Tiago, Filho de José, Irmão de Jesus"
O que dizia a pedra
O comitê recorreu então à geologia. Yuval Goren, geoarqueólogo e diretor do Instituto Arqueológico da Universidade de Tel Aviv, encontrou evidências de que sofisticados falsificadores enganaram os especialistas. Ele descobriu que a composição da pátina da parte de trás da tábua era diferente daquela da frente. Era formada de sílica, mineral não encontrado em Jerusalém, e tinha grânulos de fósseis marinhos, embora o Tempo de Salomão não estivesse próximo do mar. Além disso, notaram que a pátina da tábua foi fabricada artificialmente - partículas de carbono antigo e grânulos de ouro foram adicionados à mão. O ossário, por sua vez, era autêntico. Mas a inscrição nele, não. Os cientistas confirmaram a autenticidade da primeira parte: "Tiago, Filho de José", datada da primeira metade do século 1 d.C. No entanto, a segunda parte, "Irmão de Jesus", foi adicionada pelo menos 20 séculos mais tarde. Os resultados dessas e outras análises levaram a concluir que a tábua de pedra e o ossário eram elaboradas falsificações. Algo que, porém, nunca chegou a ser um consenso completo.Conclusões da Autoridade de Antiguidades sobre a tábua de pedra foram completamente diferentes das anteriores do Serviço Geológico[/caption]
Fraude com conhecimento de causa?
Para as autoridades, tratava-se de uma equipe de falsificadores com especialistas em várias disciplinas. Quando a polícia prendeu Oded Golan e inspecionou suas propriedades, descobriu uma oficina com uma coleção de ferramentas, materiais e "antiguidades" sendo produzidas. A evidência indicava que eles estavam lidando com uma operação numa escala muito maior do que pensavam. Os investigadores descobriram que colecionadores de todo o mundo tinham pagado centenas de milhares de dólares por artefatos que vinham de parceiros de Oded Golan. Dezenas desses objetos foram examinados por Yuval Goren - e todos eram, na sua visão, falsos.Em seguida, surgiu o receio de que artefatos feitos pela equipe de falsificadores tivessem chegado aos grandes museus do mundo. Alguns arqueólogos pediram à época que tudo o que tivesse chegado ao mercado nas duas décadas anteriores à revelação e que não tivesse certificado de origem claro deveria ser considerado falso. Muitos desses objetos, como a tábua que deu início à investigação, foram fabricados aproveitando-se do desejo de muitos de confirmar os escritos bíblicos, diziam. Em dezembro de 2004, Oded Golan foi acusado de falsificar e fraudar antiguidades e enfrentaria um julgamento que se estenderia por oito anos. Em 2012, ele foi absolvido das acusações de falsificação e fraude, mas condenado por uma ofensa menor: a de possuir objetos suspeitos de roubo e venda de antiguidades sem licença. Segundo o juiz, a acusação não conseguiu provar que os objetos eram falsos. E determinou que eles fossem devolvidos a Golan.
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